Wellington Alves
Relatórios do Tribunal de Contas do Estado (TCE) de São Paulo apontam descontrole das contas públicas na maioria dos municípios paulistas. Apenas 42 de 644 cidades paulistas – sem contar a Capital – comprometeram de maneira adequada as gestões fiscais e orçamentárias no primeiro bimestre de 2019. Campinas está no grupo dos que gastaram mais do que arrecadaram.
O quadro é preocupante. De acordo com o TCE, a Prefeitura de Campinas arrecadou R$ 1,2 bilhão até abril deste ano, com gasto de R$ 2,4 bilhões – déficit de 100%. Isso gera preocupação, já que os primeiros meses do ano, tradicionalmente, são os melhores em arrecadação, já que ocorrem os pagamentos do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano).
Prejuízo
Em janeiro, ao portal G1, o prefeito Jonas Donizette (PSB) já demonstrava preocupação com o Instituto de Previdência de Campinas (Camprev), que, sozinho, causaria déficit de R$ 600 milhões nos cofres públicos em 2019. Na época, ele admitiu que esperava a aprovação da reforma da Previdência, do presidente Jair Bolsonaro (PSL), para decidir como tratar a questão dos aposentados.
Municípios mal administrados são prejudiciais para a população, o que reflete o panorama geral no Estado de São Paulo: hospitais sem médicos ou materiais básicos, alunos de escolas públicas com baixo índice de aprendizado, ruas esburacadas ou desastres que ocorrem por causa das enchentes.
Crise geral
Apenas 6,5% dos municípios paulistas comprometeram de maneira adequada as gestões fiscais e orçamentárias no primeiro bimestre de 2019. Ou seja, só 45 prefeitos gastaram corretamente os recursos públicos. Vale ressaltar que os gestores estão no poder há, pelos menos, mais de dois anos. Não existe a desculpa de serem novatos.
Grandes passam vergonha
Em geral, os municípios gastam mais do que arrecadam. O cenário é regra nas maiores cidades do Estado. Em Guarulhos, com 1,3 milhões de habitantes, a Prefeitura arrecadou R$ 947 milhões e gastou R$ 1,5 bilhão até abril deste ano – déficit de mais de 50%. Campinas, com 1,1 milhão de moradores, tem situação pior: recebeu R$ 1,2 bilhão e investiu R$ 2,4 bilhões, ou seja, o dobro. Na sequência, São Bernardo do Campo, que tem 833 mil munícipes, recolheu R$ 801 milhões e empenhou R$ 1,5 bilhão, uma diferença de quase 90%.
Na Capital, a situação também preocupa. Segundo o Tribunal de Contas do Município de São Paulo, a gestão Bruno Covas (PSDB) já empenhou R$ 31,3 bilhões neste ano, pouco mais da metade do previsto para o ano todo (R$ 60,5 bilhões).
Instabilidade política
A ex-presidente Dilma Rousseff (PT) foi cassada pelo Congresso Nacional, em 2016, por descumprimento da meta fiscal e assinatura de decretos de crédito suplementar em desacordo com o orçamento da União.
Obviamente, ela deixou o cargo por falta de apoio político. A maioria dos prefeitos paulistas, contudo, fica suscetível a um destino parecido pelas gestões irresponsáveis.
Rotina
Para o economista Agostinho Celso Pascalicchio, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a maneira ruim pela qual os municípios paulistas são administrados repetem os contextos nacional e estadual. “Falta investimento, manutenção e organização”, aponta. Na avaliação dele, a culpa não é só dos prefeitos atuais, mas segue uma tendência de mais de uma década de gestões ruins.
Pascalicchio considera que a reestruturação das contas da maioria das cidades paulistas – e do restante do país – pode demorar até três gestões, ou seja, 12 anos. Por isso, seria importante um projeto político consistente e suprapartidário para definir as prioridades de gasto do dinheiro público.
Sociedade
Apesar do desejo de mudança política nos últimos anos, a maioria dos municípios paulistas segue em crise financeira e administrados de forma irresponsável. Para a cientista política Jacqueline Quaresemin, da Universidade de São Paulo, isso acontece por falta de pressão da sociedade civil organizada.
“Um prefeito pode governar priorizando os acordos políticos, mas vai mudar essa postura se for pressionado pela sociedade”, afirma Jacqueline. As fiscalizações do Tribunal de Contas do Estado até podem causar dor de cabeça para os prefeitos, mas nem tanto. Afinal, se as câmaras municipais derrubarem os pareceres do TCE – o que é uma prática comum – os prefeitos não serão punidos por deixarem as cidades quebradas, sem dinheiro e a população desguarnecida de serviços públicos de qualidade.
Outro lado
Questionadas, as prefeituras de Campinas, Guarulhos e São Bernardo do Campo não se pronunciaram sobre os problemas orçamentários até a conclusão desta reportagem. O espaço está aberto para manifestação.
A Prefeitura de São Paulo justificou que antecipou gastos do segundo semestre e que o orçamento está dentro do previsto.