Promotor questiona interesse público em gastos na Câmara de Guarulhos

Ivanildo Porto

Agência Estado

O promotor Nadim Mazloum, do Ministério Público de São Paulo, enviou ofícios à Prefeitura e à Câmara de Guarulhos, na Grande São Paulo, pedindo explicações sobre o projeto de reestruturação administrativa e organizacional da Casa Legislativa. A proposta cria 75 novos cargos na Câmara e está nas mãos do prefeito Guti (PSB) para ser sancionada ou barrada. A Promotoria quer saber qual é o ‘interesso público’.

O projeto original do vereador Professor Jesus (DEM) previa um gasto de R$ 10 milhões. A Câmara informou na quinta-feira, 6, que a Casa aprovou um substitutivo (Substitutivo nº 01), que reduz o gasto ‘em algo próximo de 2 milhões de reais por ano’.

De acordo com a Casa, o vale-alimentação de R$ 200 foi excluído da proposta original de Professor Jesus. O gasto, então, seria de R$ 7.651.161,16 para 2020.

Investigação

O ofício do Ministério Público é datado de 3 de junho. O promotor quer saber por que o estudo de impacto financeiro foi feito com base nos vencimentos iniciais das carreiras, uma vez que, segundo ele, não há servidores novos.

“O presidente da Câmara deverá, também, esclarecer qual o interesse público existente para a concessão de aumentos acima dos reajustes legais previstos para as categorias e para a reestruturação, bem como para a criação de 75 novos cargos no âmbito do Poder Legislativo”, questiona Mazloum.

“Deverá esclarecer, ainda, se foram considerados todos os gastos relativos às respectivas remunerações, inclusive eventuais gratificações por grau de escolaridade e outros.”

O projeto da Câmara de Guarulhos cria ainda a Diretoria de Políticas Públicas. Segundo o site da Casa, o novo departamento abrangerá um Centro de Atendimento ao Cidadão (CAC) para atender os munícipes e orientá-los na solução de problemas.

“Com essa Diretoria pretendemos ampliar os serviços que esta Casa presta à sociedade. Queremos garantir contato direto com a população e a busca de soluções para os problemas vivenciados no dia a dia”, afirmou Professor Jesus.

De acordo com a Câmara, ‘para garantir o funcionamento da nova Diretoria e a qualidade dos serviços que serão prestados, a reestruturação criou cargos de provimento efetivo de Consultor Legislativo nas áreas de veterinária, engenharia ambiental, sociologia, gestão pública, medicina, biologia, serviço social, psicologia que serão preenchidos por meio de concurso público a ser aberto em breve’.

A Prefeitura, por meio da Secretaria de Justiça, informa que recebeu um pedido do Ministério Público para fazer uma reunião com o prefeito sobre esse assunto.

Outro lado

A reportagem tentou contato com a Câmara de Guarulhos, por e-mail, na sexta-feira, 7. O espaço está aberto para manifestação.

Na quinta-feira, 6, a Câmara se manifestou desta forma sobre o projeto de reestruturação.

“Informamos que os cargos a serem criados são de natureza técnica, serão ocupados por meio de concurso público e têm como objetivo ampliar os serviços que a Câmara presta à sociedade. Serão contratados servidores qualificados para atendimento direto à população e resolução de demandas frequentemente apresentadas por munícipes (em especial pela recém-criada Diretoria de Políticas Públicas), apoio e assessoria técnica para melhoria dos projetos de Lei apresentados (cargos de Agentes Técnicos Parlamentares) e correção da defasagem e sobrecarga de trabalho em setores específicos. Além disso, grande parte das vagas será para cadastro reserva, com nomeação conforme a necessidade.

A nova Estrutura Administrativa e Organizacional cria a Diretoria de Políticas Públicas, englobando o Centro de Atendimento ao Cidadão; o Serviço de Telecentro Cidadão; o Portal da Transparência e o Serviço de Pesquisa, fiscalização e acompanhamento de Políticas Públicas, conforme determina a Lei Federal nº 13.460, de 28 de julho de 2017. A ideia de se criar o Centro de Atendimento ao Cidadão (CAC) surgiu com o intuito de dar um atendimento efetivo e institucional para as diversas demandas que os cidadãos trazem a esta Casa Legislativa diariamente. O atendimento só será possível ao munícipe com a contratação por meio de concurso público de servidores qualificados em várias áreas, para buscar solução e parcerias com os diversos órgãos e entidades federais, estaduais e municipais, para que esse atendimento seja cada vez mais amplo.

Foram criados cargos em áreas específicas que, até então, não existem nesta Casa Legislativa, tais como Analista Legislativo em Arquivologia (2), Recursos Humanos (5), Políticas Públicas (2), Assistência Social (3), Psicologia (2) e Estatística (2).

Para complementar o quadro de Agentes Técnicos Parlamentares (responsáveis por darem assessoria técnica e jurídica às Comissões Permanentes e fundamentais para análise do mérito, aplicabilidade técnica, legalidade e constitucionalidade de todos os projetos que passam na Casa), foi criado um cargo para cada área a seguir: Engenheiro de Trânsito; Engenheiro Ambiental; Veterinário; Médico; Segurança Pública; Gestão Pública; Pedagogia e dois cargos para Economista.

Foram também criados 32 cargos em Gestão Pública – Ensino Médio. Os aprovados serão nomeados conforme a necessidade, ou seja, ficarão no Cadastro Reserva.

Também foram criados alguns cargos para suprir a defasagem de alguns setores devido a aposentadorias ou aumento na necessidade de serviços. Para complementar os cargos de taquígrafos, foram criadas 7 vagas de taquígrafo apanhador. Também foi criado um cargo de Técnico em Reprografia e um de Administrador de Rede.

É importante destacar que o Projeto de Resolução que cria a nova Estrutura Administrativa e Organizacional atende a apontamentos feitos pelo Tribunal de Contas do Estado, assim como a enfrentamentos judiciais que questionavam a constitucionalidade de diversos dispositivos da Lei nº 7408/2015 (Lei de Estrutura anterior).

Em relação aos gastos apontados, não é correto afirmar que somente a criação dos cargos vai gerar um gasto anual de R$ 10 151.161,16 para 2020. Na verdade, seria prevista a despesa de R$ 7.651.161,16 para o ano de 2020 apenas se a Câmara chamasse todos os novos concursados no próximo ano. No entanto, a intenção é aguardar as aposentadorias dos servidores mais antigos e ir chamando aos poucos, conforme a necessidade.

Além disso, o estudo de impacto orçamentário apresentado pelo Diretor de Assuntos Financeiros previa o Vale alimentação de R$ 200,00, que era previsto para os servidores atuais e para os servidores novos a serem contratados. No entanto, o vale alimentação foi retirado no Substitutivo nº 01, reduzindo a estimativa do estudo em algo próximo de 2 milhões de reais por ano.

Às 16h48 da quinta-feira, 6, a Câmara de Guarulhos enviou uma nova nota explicativa. Leia seus trechos principais:

“O gasto com os cargos resultantes desse concurso público poderia chegar no máximo a R$ 7.651.161,16 caso a Câmara chamasse todos os novos concursados no próximo ano. Isso não irá ocorrer. As convocações ocorrerão gradativamente apenas conforme a necessidade, então o gasto não irá chegar a 7 milhões, muito menos 10.”

Segundo a Câmara, a reportagem se baseou em um estudo de impacto financeiro referente a outro texto do projeto, que não foi aprovado. “O substitutivo, que é o projeto que realmente foi votado, não prevê o vale alimentação de R$ 200, nem gratificação de 15% para quem tiver doutorado.”

“Também é errado afirmar que ‘os procuradores da Câmara passam, com o projeto, de um salário de R$ 11,7 mil para R$ 16 mil’. A verdade é que foi criado um plano de carreira, com avaliações de desempenho a cada quatro anos para progressão de nível, e no último estágio um procurador pode chegar a ganhar R$ 16 mil.”

“Para isso, um procurador que fosse admitido na Câmara hoje necessitaria de no mínimo 24 anos de serviço para atingir esse valor em seus vencimentos – isso se fosse aprovado em todas as avaliações de desempenho realizadas nesse período. Como fica claro, isso é muito diferente de dar um aumento imediato de R$ 11,7 mil para R$ 16 mil.”

“Destacamos ainda que a criação de um plano de carreira para os servidores públicos da Câmara é obrigatória em observação ao dispositivo constitucional que determina:

“Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.”

Da mesma forma, a Constituição do Estado de São Paulo determina que:

“Artigo 124 – Os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público terão regime jurídico único e planos de carreira.”

Assim também, a Lei Orgânica do Município de Guarulhos determina que:

“Art. 92. O Município instituirá regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta e indireta, com isonomia de direitos e deveres.””

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