Uma coleção de 5,4 mil livros, 3,1 mil peças teatrais, além de centenas de CDs e DVDs formada ao longo de 82 anos pelo ator e diretor Antonio Abujamra será incorporada pela biblioteca da SP Escola de Teatro. A escola, fundada por artistas e mantida pela Secretaria de Estado da Cultura e Economia Criativa de São Paulo, oferece formação nas diversas carreiras das artes cênicas.
Com a doação do acervo, feita em regime de comodato pela família quatro anos após a morte de Abujamra, ocorrida em 2015, os cerca de 10 mil itens ficarão disponíveis não só para os alunos da escola, mas para o público em geral. A inauguração do novo espaço da biblioteca será nesta segunda-feira, 13.
Amigo e colega de Abujamra desde o final dos anos 1970, o cenógrafo J.C. Serroni, que coordena a área de cenografia da escola, desenhou o local que vai receber o acervo. “Eu conhecia bem a biblioteca dele e sempre falava: ‘que biblioteca incrível’”, conta sobre a relação próxima que tinha com o diretor. Serroni diz ainda que várias vezes pôde contar com a ajuda do amigo que emprestou livros e revistas para ajudá-lo em seus trabalhos.
Mesmas estantes
Por estar familiarizado com a biblioteca do diretor, Serroni tentou manter o espírito do espaço original no local que vai acolher o acervo. “A primeira coisa que eu imaginei foi: ‘vamos manter aquelas estantes que ele tinha, originais’. Porque eu acho que é a história dele ligada a isso tudo. Complementei com outras novas na mesma linha para acomodar tudo o que eram documentos, CDS e textos”, comenta sobre as escolhas que fez. “São estantes simples, pretas, de ferro com piso em madeira. Eu achei legal conservar”, detalha.
A partir das premiações recebidas por Abujamra ao longo da carreira e as fotografias que registram momentos importantes da sua vida, Serroni projetou ainda uma entrada especial para o espaço. “Eu criei na entrada um pórtico que tem fotos dele, prêmios. Uma vitrine que você entra por dentro dela”, explica. Durante o primeiro mês de abertura do acervo poderão ser vistas ainda três maquetes feitas pelo cenógrafo para espetáculos do diretor.
Rumo à televisão
Abujamra começou a carreira no teatro no final da década de 1950. Inicia os trabalhos como diretor em 1961, dirigindo Raízes, de Arnold Wesker, no Teatro Cacilda Becker. Faz ainda, no mesmo ano, Do Parto à Sepultura, de Augusto Boal, no Teatro Oficina. A partir de 1962 dirige uma série de montagens para a produtora Ruth Escobar. Em 1963, funda, junto com Antônio Ghigonetto e Emílio Di Biasi, o Grupo Decisão, para difundir o teatro político com base nas técnicas do dramaturgo alemão Bertolt Brecht.
Uma parte importante da biblioteca particular de Abujamra é justamente, segundo Serroni, sobre o alemão, conhecido pelo desenvolvimento da estética do teatro épico. “Tem muita coisa específica de quando ele viveu na Alemanha. Que eu conheço, é uma das coisas mais completas sobre Brecht e sobre teatro alemão. Muitos livros em francês, inglês e alemão”, detalha a respeito do material deixado pelo diretor.
O novo acervo soma-se, de acordo com Serroni, a outras doações recebidas pela escola. “A gente está criando uma grande biblioteca específica para teatro. É aberta ao público, não é só para os alunos da escola”, enfatiza. Ele conta que 70% da coleção de Abujamra é sobre artes cênicas. Há, no entanto, registros e recordações do diretor, como cartões-postais, programas de espetáculos e roteiros como o da série O Pequeno Mundo de Dom Camilo, veiculada pela TV Tupi.
Ao longo da vida, Abujamra trabalhou também como ator no teatro e em novelas televisivas. Teve destaque ao interpretar o bruxo Ravengar, na novela Que Rei Sou Eu?, transmitida pela Rede Globo em 1989. Em 2000 começou a apresentar o programa Provocações, na TV Cultura. As 318 edições do programa, exibidas ao longo dos 15 anos em que a produção foi ao ar, também fazem parte do material legado à biblioteca da SP Escola de Teatro.